terça-feira, 25 de agosto de 2015

SAUDADE DE KAFKA

Senti solidão.
Naquela sala, com tantos servidores públicos mexendo em seus computadores, digitando números de processos judiciais contendo problemas que demorarão a ser resolvidos ou nunca o serão, naquela cadeira azul acolchoada na qual eu esperava o número do recurso da idosa de 80 anos que está em sua cama aguardando cuidados médicos e o plano de saúde negou a cobertura e a juíza também, naquela tarde de terça-feira naquele prédio chamado Tribunal de Justiça, lá eu senti solidão.
Nenhum dos seres humanos daquela sala faziam parte do meu mundo. Conecto-me com eles por força de um trabalho-missão que exerço por força de um dever assumido de pagar contas por força de um sistema capitalista que faz todos darem sua força para servir a esse sistema. Eu poderia estar lendo um livro de Agatha Christie como o vendedor de milho da esquina. Mas não, eu estava mendigando que um ser humano mande outro ser humano cumprir um contrato pra mandar outro ser humano visitar aquele ser humano de avançada idade e dizer qual a melhor maneira de tratá-la. Se não houvesse esse sistema, era só o ser humano ir lá.