sexta-feira, 18 de março de 2016

QUE TAL SUBSTITUIR ESSA CONSTITUIÇÃO POR UMA DEMOCRÁTICA?

Do jeito que foi arquitetado o esquema de representatividade na Constituição Federal de 1988, não há como ter democracia. Os políticos brasileiros não representam o interesse do povo. É trocar um corrupto por outro corrupto.
Três coisas previstas pelo constituinte originário que tornam a sonhada democracia somente um signo no papel: 1) financiamento privado de campanha (que engessa a escolha da “soberania popular”, conduzida por publicidades enganadoras); 2) prerrogativas de foro de acordo com a função (o que quebra o princípio da igualdade),  e 3) o jogo de escolha e nomeação dos principais cargos decisórios do país (STF, STJ, TST etc), sendo do Executivo o poder de sitiar seu time para julgar de acordo com seus interesses. Isso sem falar no monopólio das telecomunicações. Ainda há a prescrição legal de crimes contra a administração pública, enquanto o terrorismo é imprescritível (mas há coisa mais terrorista do que vender um país, um Estado, uma cidade, a consciência de um povo?!). Com esses institutos, não se consegue investigar e definitivamente condenar um político no Brasil, tem sido assim desde sempre. Não é voltando os políticos de direita, descendentes de políticos de direita, nem substituí-los por políticos de esquerda, nem destrocando de novo que esse problema vai ser resolvido. Não resolve. A política brasileira é um jogo que ninguém aguenta mais. O projeto de colonização brasileira não foi interrompido, nem na ditadura militar, nem por qualquer dos supostos governos eleitos democraticamente, nem de direita, nem de esquerda.
Se essa Constituição está aí como democrática e a representatividade do povo não é alcançada, e considerando que eu nada sei, vou divulgar um documento que me foi entregue por Paris Gaitano, um filósofo grego helenístico, como sendo os 12 valores, 18 princípios e 3 leis de uma pólis. Os 12 valores estão agregados em grupos de 3, e o último leva ao primeiro, em um movimento circular. Essas são as leis cósmicas da humanidade, segundo ele. Como um foi presente dado a uma “female researcher”, com um pedido para divulgá-lo, eis as leis, na íntegra:
“AS TRÊS LEIS PÚBLICAS BÁSICAS QUE ATUAM NA CONTEMPORANEIDADE PARA FORMAR O VALOR BÁSICO DE TODAS AS AÇÕES, PRÁTICAS E CONDUTAS.
Lei da Reparação Integral
1.           Tens a liberdade de fazer o que quiseres, contanto que possuas a capacidade de reparar total e integralmente as consequências de teus atos.
2.           Tens a liberdade de danificar, estragar, destruir e até matar, parcial ou integralmente, em forma ou em conteúdo, apenas na medida em que sejas capaz de reparar, completa e integralmente, aquilo que danificaste, estragaste, destruíste ou mataste.
3.           Até mesmo o pensamento, no que se refere a qualquer alteração aos campos material, psíquico ou espiritual aplicáveis à pessoa humana, subscreve-se à lei da reparação completa e integral. O cultivo de todo e qualquer pensamento de desejo ou plano fora do âmbito desta lei imbui-se, desde seu princípio, de morte consciente.
4.           É crime contra o Estado e contra todos os seus cidadãos subtrair, tomar para si ou explorar coisa estando ausente a capacidade de repô-la em sua integralidade e exatidão.
5.           São crime contra o Estado e contra todos os seus cidadãos as decisões de criar danos irreparáveis à economia, ao âmbito social, à educação, ao trabalho, à segurança, à proteção, à seguridade, à previdência, à abundância, à estética e à harmonia social.
6.           São crimes contra o Estado e contra todos os seus membros todas as tuas intervenções de caráter irreparável.
7.           A violação à lei da reparação completa e integral assenta-se fora do corpo do Estado social, levando à condenação fatal de sua consciência. A aplicação de pena física pertence ao Estado, por meio de suas leis.

Lei do Espelhamento
1.           Tens o direito de fazer o que quiseres, bastando, para tanto, que tenhas posto em prática e aceitado, mediante prévia simulação em teu interior, o resultado de teus atos, de tuas escolhas e de tua conduta.
2.           Podes tornar teu companheiro quem quiseres, bastando, para tanto, que antes tenhas aceitado isto para ti.
3.           Podes fazer o que quiseres, contato que tenhas aceitado isto antes para ti e para teu ambiente.
4.           O que não aceitares para ti, não poderás fazer nem impor a terceiros.
5.           O que não aceitares para teus filhos, não poderás fazer aos filhos de terceiros.
6.           O que não aceitares para teu próprio ambiente, não poderás fazer à sociedade nem a parcela da sociedade.
7.           A violação da Lei do Espelhamento assenta-se fora do corpo do Estado social, levando à condenação fatal de sua consciência. A aplicação da pena física pertence ao Estado, por meio de suas leis.

Lei da Publicidade
1.           Tens o direito de fazer o que quiseres, contanto que a motivação de tuas ações, de tuas escolhas e de tua conduta possuam viés público.
2.           A motivação subjacente a toda e qualquer ação, escolha ou conduta de ti proveniente deve exsudar espírito público e ser reconhecidamente digna de virtude.
3.           Seja qual for tua aspiração, ela não pode encontrar-se segregada do corpo estatal, nem ser para ele um segredo.
4.           Todas as propostas, ideias e inovações, independentemente do formato da tecnologia, ciência ou arte, sejam elas regras, leis, instruções ou orientações, devem tocar o sistema de valores do ser humano e pertencer a toda a sociedade e a todos os cidadãos, a fim de terem, estes, acesso à técnica criada.
5.           A técnica e a aplicação de todas as propostas, inovações e ideias devem funcionar harmonicamente dentro do sistema de valores e encontrar-se dentro do quadro de princípios funcionais do Estado, de forma a compreender, diacronicamente, anageneticamente e atualizadamente, toda a sociedade de forma conjunta.
6.           Todas as inovações, propostas e ideias são formulações provenientes do banco de memórias universal e, como tais, pertencem hereditariamente a todos os cidadãos. Todos devemos respeitá-la, vez que a cobiça contra ela empreendida é cobiça que recai sobre toda a sociedade.
7.           Vez que as inovações pertencem a toda a sociedade, o Estado e seus cidadãos têm o dever de protegê-las, sob pena de serem punidos aqueles que transgridem referido dever.
8.           Todo aquele que avançar causa cujo objetivo seja o mal do Estado, quer na área da economia, do âmbito social, da educação, do trabalho, da segurança, da seguridade, da previdência, da abundância, da estética ou da harmonia social, traz a si próprio o oblívio da consciência, automaticamente incorrendo na morte de sua conscientização.
9.           Os líderes e as autoridades do Estado têm o dever de proteger com a própria a vida todo e qualquer legado oriundo de nosso Estado e de nosso povo. 
 VALORES
A República Helênica promove o sistema axiológico grego porque apenas dentro dele o homem ontologicamente toma o lugar que lhe pertence, tornando-se assim um cidadão em comunidade, gerando civilização.
Valores são aquelas propriedades que quanto mais enlevadas pelo homem, mais o colocam em seu meio.
LÓGICA
É o meio que leva ao intelecto capaz de aceitar o correto e a realidade exclusivamente por meio do processo comprobatório.
LIBERDADE
Coloca o homem em um dinâmica ilimitada e infindável de possibilidades, primariamente em um caminho voluntário em direção à busca e implementação de parte dos líderes estatais com a maior abordagem possível da lei de causa e efeito.
VIRTUDE
É uma excelência do saber que se imprime a todas as manifestações e decisões, sem que a motivação seja a vantagem ou o benefício próprios.
JUSTIÇA
Como instrumento da aplicação distributiva, retaliativa ou de reciprocidade do justo.
IGUALDADE
É o benefício exato da igualdade de oportunidades para todos os cidadãos, sem distinção de qualquer tipo. O aproveitamento de tais oportunidades, contudo, depende de cada cidadão isoladamente.
ABUNDÂNCIA
É a suficiência de benefícios provenientes de bens materiais e espirituais, conforme as oportunidades dadas a todos os cidadãos, como condição necessária para evitar a inveja.
VERDADE
É a saída do oblívio ontológico e a identificação do funcionamento intelectual com o existencial
ESTÉTICA
É tudo o que, permeando o interior dos sentimentos, esconde-nos a sensibilidade que carregamos inerentemente em nosso interior
HARMONIA
A convergência, o encontro, a conexão de diferentes ou opostos em um total compassado, de correta proporção e perfeito entrosamento.
CORAGEM
“Coragem é o hábito d’alma imóvel sob o medo; a disciplina das coisas sob guerra; bravura na guerra; temperança d’alma face ao terrível e medonho; prudência resoluta ao servir; francas expectativas face à morte; hábito de preservação de tudo o que é considerado justo face ao perigo.”
EUDAIMONIA
O caminho e o destino final do percurso do ser humano quando se identificam com o logos (objetivo) de sua existência
CONHECE-TE A TI MESMO
Nosso autoconhecimento acerca de quem somos, de onde viemos, em que nível nos encontramos e para onde vamos. 

PRINCÍPIOS
Princípios = implementações de projeções operacionais do sistema de valores.
Princípios são marcas referenciais do sistema social que criam determinado contexto operacional.
PRINCÍPIOS VALORATIVOS (emanam dos valores)

DIALÉTICA
Técnica para se chegar à Verdade e obter as conclusões corretas.
LIBERDADE SOCIAL
Em uma sociedade livre, garantem-se a justiça e a meritocracia, e os cidadãos lutam indiscriminadamente em favor da renovação das leis e instituições.
LIBERDADE CIVIL
O exercício da ação civil e política é dever de todos os cidadãos. A participação do direito de votar e ser votado, de reunião, de participação nos domínios de interesse comum e no exercício do controle de autoridade.
LIBERDADE INDIVIDUAL
É a demonstração da vontade livre dos indivíduos pertencentes a um Estado enquanto no contexto da liberdade social, devendo, esta última, prevalecer em todos os casos.
ISONOMIA
É, de um lado, a igualdade entre os cidadãos face às leis e à aplicação da lei indiscriminadamente a todos os cidadãos, e, de outro, o funcionamento sem a mínima interdependência entre as autoridades executiva e legislativa.

IGUALITARISMO
São os mecanismos garantidos por meio da igualdade de tratamento dos cidadãos em nome do Estado, bem como a concreta reciprocidade das relações entre cidadão e Estado.
ISOCRACIA
É o ônus das decisões do Estado quando aplicadas a todos os cidadãos sem distinções, exceções etc.
ISEGORIA
Todos os cidadãos devem gozar de igual direito de expressão.
JUSTIÇA DISTRIBUTIVA
Deve centrar-se “não sobre a palavra, mas sobre o intelecto jacente na vontade do legislador”.  O foco de seu funcionamento, deve assentar-se não na distribuição dos axiomas unicamente, mas, de forma geral, nos direitos, com os quais a ordem legítima arma os indivíduos de acordo com suas relações jurídicas.
JUSTIÇA CORRETIVA
Tem como objetivo a preservação do Estado no sistema de valores e princípios. A má conduta por parte dos membros do corpo do Estado contam como má conduta ao próprio Estado. Assim, o Estado é responsável por parar a injustiça caso a encontre em curso e, em todos os casos, erradicá-la, proporcionalmente ao delito, por meio de correção ou penalização.
E em relação às duas orientações, tanto a distributiva quanto a corretiva, a justiça expressa o princípio da proporcionalidade enquanto fundamento da ordem ideal e integralizada.

PRINCÍPIOS SOCIAIS
(Emanam dos costumes da sociedade).

BOM SENSO
É a causa do “fazer corretamente”. Modo de pensamento e prática correspondente caracterizada pela razão, prudência e maturidade.
O bom senso é “a força criadora do bem estar humano”: transcende o saber, pode separar o correto do falso e permite ao homem ponderar “o que deve ser feito”.
Gera o moral, anima e organiza a ação, conforme corporifica o contexto do pensamento, do conhecimento e da vontade, princípios sobre os quais assenta-se a ação.
SOFRÓSINA
O significado da sofrósina é a operação intelectual, definindo-se como o controle das emoções, “o coibir dos prazeres e desejos”, conjugado com o fazer-se – mediante o uso da razão – senhor de si mesmo. Ser sofronístico significa constituir-se, integrar-se, tornar senhor de si mesmo.
VERGONHA
Expressa a característica humana de se abster das práticas que sejam contrárias aos códigos institucionais morais da sociedade em que se insere o indivíduo, em prol do respeito e da decência. A vergonha mantém espiritualmente sob rédeas os seres humanos, de forma a não colidirem entre si, evitando e impedindo assim a injustiça e resultando na ausência de perturbações a uma simbiose uniforme, na garantia de coesão do todo, na preservação do equilíbrio e na predominância da eutaxia dos organismos sociais. A vergonha compreende a base da simbiose social, sendo também pré-requisito para o desenvolvimento da civilização.
A vergonha reforça a dignidade de cada indivíduo, pois o impede de render-se ao caos de seus impulsos, obrigando-o a portar-se conforme aquilo que lhe diferencia dos outros seres vivos: a razão. Ao mesmo tempo, reduz suas disposições egoístas, seu autointeresse, sua agressividade e cupidez, revitalizando-lhe aquelas forças que conduzem à consolidação da harmonia social.
RESPEITO
É o princípio da lei universal de causa e efeito.
Observando o cosmos que nos cerca, descobrimos a observação das leis e dos princípios da lei de causa e efeito, as quais representam, bem como o ser humano, partes do todo universal. Também é autoexplicativo o homem sentir profunda estima e admiração pelo ambiente como um todo no qual se insere. A distribuição de nossa inserção nesse ambiente universal cria o respeito a ele.
O respeito é o sentimento prático da autoestima que possui o homem por si mesmo, reconhecendo seu lugar no universo.
Imputamos respeito também aos indivíduos cujo valor e superioridade especiais reconhecemos. A definição precisa de amor é o respeito, pois este não possui como objeto o homem que o manifesta, mas aplica-se ao indivíduo que comprovadamente o merece, sem nada exigir nem pedir, mas ganhando-o e preservando-o com nada mais que seu esforço contínuo. 
MERITOCRACIA
“Toda pessoa deve falar, praticar e reverenciar conforme seu valor”.
Em nível individual, o termo “meritocracia” declara o princípio segundo o qual a tomada de valores e cargos públicos, o reconhecimento e as recompensas de tentativas tornam-se, como base, o valor pessoal de cada um, sem serem obstaculizados por seu status econômico ou social. Ela confirma e dá aval ao indivíduo. Ao mesmo tempo, leva ao autoconhecimento e à conscientização das debilidades concretas, as quais tenta eliminar, bem como das habilidades que o mobilizam para o cumprimento de seus objetivos. A meritocracia leva à realização emocional e à satisfação pessoal, contanto que o indivíduo seja merecedor em relação a si mesmo e se reconheça socialmente de forma proporcional aos esforços que empreendeu. Recomendam-se ações para o empreendimento de forças, maiores esforços e para a tomada de iniciativas em prol do aumento de eficiência do indivíduo.
Ela constrói sua militância, que usa para combater todos os obstáculos à concretização de seus objetivos.
No campo social: desenvolve-se a competitividade cível entre os membros da sociedade.
Cultiva-se a consciência social e os indivíduos socializam-se entre si amigavelmente, sentindo-se organicamente ligados ao todo social, o que resulta no desenvolvimento da cooperação e solidariedade e na promoção da coexistência social.
Asseguram-se o equilíbrio social e a justiça, enquanto, ao mesmo tempo, reduzem-se as diferenças econômicas e sociais entre cidadãos. Avaliam-se os cidadãos com critérios justos e objetivos, satisfaz-se o sentimento público acerca da justiça e desenvolve-se confiança nas instituições públicas e nas leis públicas.
AFEIÇÃO
A afeição é como qualquer tipo de força física que atrai, todo tipo de força de reconciliação e união social ou todo tipo de força de imunidade e de homeostase de um organismo.
Como força social atrativa, delineia a imagem do corpo invisível de uma cidade, sua alma coletiva, na qual prevalecem a concórdia e a união de todos os cidadãos. Nessa cidade e nessa sociedade, governa a absoluta articulação entre indivíduos sociais e inseparáveis ambos. Ao menos espiritualmente.
A afeição é a força unificante capaz de resultar na paz e tranquilidade da conscientização, que se torna una.
ORGULHO
O conceito destaca primeiramente a motivação em prol da distinção honrosa, excelência e glória. É o intenso sentimento de honra e dignidade.
Compreende-se como orgulho aquilo que não se exaure no interesse individual, mas é canalizado em direção à contribuição social, incorporando, portanto, as aspirações pessoais nos valores sociais, para que se possa trabalhar em favor do benefício da sociedade. O orgulho é aferido e atribuído ao indivíduo a partir de todo o corpo da sociedade, e não de determinada loja, ordem, associação nem parcela social específica.
MAGNIFICÊNCIA
São as impressões sobre os sentidos provenientes de práticas, condutas, ações, apresentações, pensamentos que trazem majestosamente à baila o bom, o apropriado, o belo, o virtuoso, o justo.
Quanto mais a consciência humana encontrar-se harmonizada com o propósito de sua existência, mais a magnificência emanará de suas manifestações.
A magnificência distancia-se do homem na medida da pequeneza de suas lamúrias.
A magnificência encontra-se gravada no povo helênico.
O legado de nosso povo no planeta terra é caracterizado em primeiro lugar pela magnificência”.
(Tradução do grego para português: Haggen Kennedy).


quinta-feira, 10 de março de 2016

CONSUMIDOR BRASILEIRO: O NEW SLAVE

“Se você tira a mentira vital de um homem comum, tira-lhe ao mesmo tempo a felicidade” (Henrik Ibsen). Como, então, dizer ao consumidor brasileiro que seus direitos são uma farsa, sem conseguir ganhar ferozes vozes contrárias me dizendo que estou errada?
Aqui eu não vou falar de corrupção nem de combustível fóssil, mas de combustível humano. Vou falar de como a força de trabalho dos consumidores brasileiros está na mão das instituições financeiras. Para mim, algo muito mais sério que petróleo. Pois de fato não sei se “há algo de podre no reino da Dinamarca”, mas que há no Brasil, há. E não é de agora.
CASO 1: Os planos econômicos
Sou de uma geração que cresceu aos domingos ouvindo no Faustão a musiquinha publicitária “o tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindos continua numa boa... é a poupança Bamerindos!”. Os melhores comerciais eram os de poupança: em um, a mulher queria fazer a festa de casamento, poupava e estava lá de vestido de noiva contando sua alegria. No outro, o homem comprava seu carro sonhado. Tinha um que a senhorinha comprava o brinquedo tão querido de seu neto. Todos associavam poupança à “felicidade” (e esses eram os “valores” vinculados ao sucesso pessoal). Foi numa época que um presidente da direita assumiu, todo pomposo, e sua posse foi marcada pela esperança da caça aos marajás. Com uma mão, o então presidente deu o Código de Defesa do Consumidor aos brasileiros; com a outra, confiscou suas poupanças, causando pânico e terror generalizado entre a “classe média”. Isso eu não entendia. Só vi os adultos aperreados. Muito. Alguns até se mataram. Eu não entendia nada.
Só vim tentar começar a entender quando numa matéria do Jornal Hoje a Rede Globo rememorava os 20 anos dos planos econômicos, dizia que quem tinha poupança naquela época teria direito à diferença da correção dos valores e, por fim, mostrava um consumidor que tinha conseguido na justiça receber a diferença corrigida daquele “erro de cálculo”, logicamente com um sorriso no rosto esperançoso com o alvará judicial, o qual iria utilizar para reformar sua casa. Ao final, a reportagem mandava procurar as Defensorias Públicas de todo o Brasil para “garantir seu direito”.
Ocorre que praticamente não há Defensor Público nesse país, que dirá para atuar na área de direito de consumidor. Os poucos que tinham enlouqueceram com a súbita demanda de milhares de pessoas às suas portas e, se não os atendessem, os consumidores “perderiam seus direitos”. Resultado: Ação Civil Pública para garantir o direito de quem se encontrava na mesma situação e, posteriormente, com a sentença favorável, na fase de liquidação da sentença seriam individualizadas as demandas e supostos créditos.
Todavia, não contávamos com a astúcia do sistema financeiro. Quase que como um erro sobre a pessoa do Código Penal, o STJ atirou em um e acertou o outro: decidiu inovar sua interpretação e definiu o prazo de 5 (cinco) anos para propor Ação Civil Pública, com analogia ao prazo previsto na lei da Ação Popular. Não seria mais o prazo do direito, como era interpretado até então. Ou seja, aquela Ação Civil Pública dos planos econômicos está fadada ao insucesso (pois proposta com base no prazo prescricional do direito, ou seja, 20 anos). O “alívio” na consciência dos Defensores é que também as ações individuais estão sendo julgadas improcedentes, porque os Tribunais entendem que o consumidor precisa comprovar o valor que tinha na conta ou ao menos a existência desta (inversão do ônus da prova como previsto no CDC? Ilusão!). Como a mídia já há anos ensina que o consumidor só deve guardar comprovante por 5 anos, quase ninguém tem comprovante de poupança de 20 anos, até porque os bancos daquela época já foram quase todos extintos ou transformados e re-transformados em outros. Passa-se mais tempo tentando achar o paradeiro de um banco do que para entender o Código de Defesa do Consumidor. O Banco Bamerindos, se está numa boa, não sei, porque já não existe mais. Eu, como naquela época, continuo sem entender nada e a ver os adultos aperreados. Muito.
CASO 2: A penhora do salário
Pouco mais de dez anos do confisco das poupanças, as pessoas já não tinham mais a prática de economizar para comprar. Começaram a comprar parcelado. Inicialmente, 3 parcelas, depois, 9, 12, 24, 48, 60, 90, 10 anos. Divida, dívida, uma diferença de acentuação.
Já com um governo de esquerda, veio a penhora de 30% do salário. Em 2003, foi autorizado ao consumidor fazer financiamento com pagamento a ser descontado diretamente no seu contracheque. Não estou falando de 30% do valor líquido, após descontos de INSS, sindicato, plano de saúde empresarial, convênio farmácia ou convênio supermercado firmados em acordo coletivo de trabalho, assim como pensão alimentícia. Estou falando do valor bruto, ou seja, a cada R$ 100,00, R$ 30,00 passaram a ser para pagamento à instituição financeira.
O Banco BMG, patrocinador da campanha do PT e de praticamente todos os times de futebol do Brasil, saiu na dianteira, abocanhando parte do ordenado de aposentados de todo o país, para pagamento de financiamentos com juros supostamente modestos se comparados com os do cheque especial, seduzindo os “novos consumidores” a se endividarem para adquirir bens de consumo até então supérfluos, especialmente as televisões, cada vez maiores e mais atrativas. Engraçado que a gente vê na Justiça um grande índice de reclamação por produtos com defeito, especialmente geladeiras e máquinas de lavar. Muito raramente uma televisão dá problema. Não é à toa que o serviço de telecomunicações é tido como serviço público essencial pela lei. Quando todos vivem numa realidade de Matrix, realmente desplugar é o fim dos tempos.
E aquele contrato inicial de financiamento feito pelo idoso parece se multiplicar na mão de instituições financeiras que nem agência física têm. Só descobrimos a existência delas quando, na Justiça, vamos atrás e percebemos que são instituições que compraram créditos de outras instituições financeiras, e saem fazendo descontos dos consumidores, renovando os contratos, creditando valores nas contas correntes dos idosos e depois descontam as parcelas de novos empréstimos que o consumidor nem sabe o que é e nem sabe a quem perguntar, pois nem conhece aquela instituição financeira. É pior do que bactéria.
Ano passado, por Medida Provisória, essa porcentagem de desconto no salário do trabalhador/aposentado passou de 30% para 35%, pois esses 5% serão para pagamento de despesas contraídas por cartão de crédito. Afinal, as instituições financeiras precisam da contrapartida dos patrocínios às campanhas eleitorais.
CASO 3 – Juizado especial e operadoras de cartão de crédito
Embora já de hoje é cantado que cartão de crédito é uma navalha, o povo, acostumado com músicas monossilábicas, caiu no conto do vigário. Como o Código de Defesa do Consumidor diz que são nulas as cláusulas que onerem excessivamente o consumidor, o iludido que pagou por meses “o mínimo” da fatura vai ao Juizado Especial para, sem advogado, utilizar o benefício da assistência gratuita e revisar seu débito, que só conseguirá pagar se morrer e nascer 5 vezes, tamanho é o montante de juros sobre juros.
Ocorre que há juiz que julga desfavorável ao consumidor e, acatando um pedido da instituição financeira (pedido contraposto), julga favorável à empresa, concedendo a esta agora um título executivo judicial. Já vi um caso assim, no qual o consumidor entrou no Juizado como autor e saiu como réu. Como não estava acompanhado por advogado, nem entendeu a sentença, e não recorreu. Chegou lá na Defensoria para fazer a contestação de uma ação de cobrança, cujo valor ele nem conseguiu discutir. “E agora, José? A festa acabou...”
CASO 3 – O sonho do carro próprio.
Aí o sujeito vê o comercial do carro na televisão e vai à concessionária. O carro que valeria 5 ele compra por 10 e faz um contrato de financiamento pra pagar 30. Quando chega na prestação 6, fica desempregado, alguém adoece na família, algo aleatório acontece, não consegue pagar mais. Um grande escritório de advocacia contratado pela instituição financeira rapidamente consegue a busca e apreensão do veículo (processo que com o novo CPC vai ficar ainda mais rápido), leiloa-o por 3 e cobra 27 ao consumidor, pois as 6 prestações que ele pagou ficaram para os honorários, custas, juros de mora etc.
CASO 4 – O ‘new slave’
Há pouco mais de cem anos, os escravos sabiam de onde vinham as chibatadas. Fugiam para quilombos, rebelavam-se. Agora, os “new slaves” são chicoteados por suas próprias mentes, atormentados por dívidas, dívidas estas “voluntariamente” contraídas por eles. Após um dia enfadonho de trabalho, chegam a suas casas e se conectam com as televisões ou redes sociais. Não mais se rebelam, não sabem nem como. Nem os líderes conseguem compreender isso. Estão preocupados com o time que irá vencer a próxima eleição, se de direita ou esquerda, sem perceber que ambos estão preocupados com a resposta aos patrocinadores, os quais, convenhamos, devem controlar também os números das urnas eletrônicas.
Não vou nem falar do contrato de FIES no qual os consumidores figuram como fiadores. Até porque o povo não sabe, mas só há duas certezas nessa vida: que vamos morrer e que o fiador se lasca. Nos contratos, as instituições financeiras colocam cláusulas nas quais o consumidor renuncia direitos tais como benefício de ordem (cobrar primeiro ao devedor principal contratante e só depois ao fiador), porque até bem de família o fiador pode perder para pagar dívida. Isso não é esclarecido ao contratante. A pessoa de boa-fé só descobre isso depois.

Vou terminar falando do senhor idoso que chegou essa semana reclamando que estava com pressão alta, passou mal no Fórum Rui Barbosa, foi levado a uma sala, onde foi atendido e medicado. Tinha ido pegar o número de seu processo, pois teve seu nome incluído no cadastro de inadimplentes e estava recebendo descontos de um contrato de financiamento que não fez. Sua parca aposentadoria é para comprar alimento industrializado no supermercado, remédios, transporte para suas idas e vindas a médicos. Expliquei para ele que o nome dele é algo virtual, um signo escolhido pela mãe dele, que o CPF é algo virtual, um signo escolhido pela Receita Federal. A única coisa real e viva que existia naquela sala era ele e eu, seres humanos. Perguntei o que ele tinha se alimentado. O consumidor brasileiro, só porque mora no Brasil, é hipervulnerável. Ele entendeu a explicação sobre como poderia economizar com medicamentos e idas e vindas a consultórios médicos se passasse a se alimentar corretamente e a praticar exercícios físicos, assim finalmente conseguiria se libertar desse sistema virtual. O tempo livre, deveria procurar algo de criativo para desenvolver suas habilidades, plantar, aprender algo novo. Afinal, nesses tempos de lideranças políticas desonestas, seja de direita ou esquerda, a liberdade é um caminho a ser traçado individualmente, como já dizia o advogado Gandhi. Mas só é para quem quer experimentar dessa palavra “que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda”, como definia Cecília Meireles. Como a lei aprisiona, o “new slave” pode se libertar sem depender de lei áurea, é questão de tempo, educação, persistência e criatividade. Só precisa saber disso pra começar.

domingo, 6 de março de 2016

VIOLÊNCIA E INSTITUIÇÕES PÚBLICAS: UM TAPINHA NÃO DÓI?


POLICIAL: Depende. Se for um tapinha meu, aliás, tapinha não, que sou fortinho, tapão, não, não dói. Independente de quem seja, homem, mulher, autoridade ou do povo. É o uso necessário da força, afinal, o Estado sou eu. Aliás, se for pobre ou manifestante, aí que não dói mesmo, porque já estão acostumados. Mas se triscarem em mim, dói e eu revido. Aliás, não precisa nem triscar, só precisa olhar pra mim torto, ou chamar de policialzinho, imbecil, qualquer coisa, afinal, o Estado sou eu. Pode anotar meu nome e procurar seus direitos. Se quiser eu soletro: E-S-T-A-D-O. Não vai dar em nada mesmo.

PROMOTOR DE JUSTIÇA: Depende. O que diz o inquérito? Posso responder quando eu voltar dos meus 72 dias de curtição (60 dias de férias + 12 de folga) na casa de praia ou na Europa, pagas com meu 14º e 15º salários + auxílio moradia + adicional eleitoral? Era pra eu fiscalizar a polícia, n’era?! Depois do recesso forense, pode ser?

JUÍZA: Depende. Qual o parecer do Ministério Público? Aliás, hoje vou decidir por mim mesma! Deixa-me julgar logo esse processo, que acabei de voltar de minhas férias, recebi meu contracheque com vários adicionais e hoje estou inspirada: SENTENÇA – Vistos, etc. Um tapinha não dói. Nem um tapa, nem um espancamento, nem um tiro, nem uma chacina. É legítima defesa. Os acusados lançaram mão do meio necessário para repelir as injustas agressões dos ofendidos. É instinto natural de sobrevivência. Pobre deveria ter desenvolvido “couro de rato” pra se proteger. Está vendo? Não evoluiu pra se adaptar. Darwin tinha razão. Tem que morrer mesmo, é seleção natural, meu bem, não estudou isso na escola? [1]

DEFENSORA PÚBLICA: Depende. Se for em mim e eu tiver levado porque estava defendendo alguém, um tapinha não dói. O que dói é a impunidade. Mas se for num assistido da Defensoria, dói e vou lutar com os meios legais pra fazer sua defesa, mesmo sabendo que ao final vou perder a ação. Afinal, fui contratada pra isso, defender quem mereça ou não, e, mesmo minha equipe sendo em número insignificante e o tempo todo tenhamos nossas supostas prerrogativas e autonomia desrespeitadas, o povo precisa pensar que eu existo, senão se revolta.[2]

GOVERNADOR: Depende. Se for de um jogador de futebol em um jogo, faz parte. Se for da polícia também. Pra mim é tudo a mesma coisa, somos todos do mesmo time, da mesma empresa, ou será que ninguém percebeu isso? Peraí que vou ali, está no intervalo comercial da novela e o patrãozinho patrocinador quer que eu veja o novo galã escolhido pra promover suas marcas. E hoje é dia de jogo Bahia x Vitória. Êta Bavi animado!



[1] Para ilustrar: em 24 de julho de 2015, em Salvador-BA, primeira capital do Brasil, foi proferida sentença no Proc. nº 0314066-69.2015.8.05.0001 pela juíza substituta, absolvendo polícias que chacinaram adolescentes no bairro do Cabula, periferia de Salvador, sob o argumento de que agiram em legítima defesa.
[2] Para ilustrar 2: em 18 de julho de 2015, em Salvador-BA, primeira capital do Brasil, policiais militares bateram e prenderam uma Defensora Pública que foi argui-los sobre o espancamento público e prisão ilegal de vendedores ambulantes na praia do Porto da Barra, em pleno sábado à luz do dia. Nenhuma resposta foi dada até o momento, por nenhuma instituição. A Defensora responde por crime de desacato, porque, após a violência policial, teria os chamado de imbecis.

A LÍNGUA E O PROCESSO

A LÍNGUA E O PROCESSO 1

    Eu não tinha ideia dessa paranoica epopeia de desvendar as modificações nas normas da língua portuguesa e do processo brasileiro. Várias palavras e processualistas estão agora sem acento, por isso, de pé eu viajo nessas leis. Heroicas foram as pessoas que se anteciparam e estudaram as regras antes de suas estreias. Vendo esse deus nos acuda, reconheço-as como verdadeiros(as) heróis/heroínas mesmo, super-homens/supermulheres. Por isso, vamos tentar descobrir, por entre os pelos desses animais selvagens, quais as mudanças no jogo entre as pessoas separadas por um hífen, formando dois polos de um processo judicial, o qual, muito menos divertido que o jogo de poloaquático, é feito na mesa e precisa de muitos papéis e pessoas de profunda boa-fé para que dê certo.
    Os que creem num milagre e que o processo irá subitamente correr em tempo razoável, prevejo isto ser uma utopia. Há algumas pessoas super-resistentes a mudanças, mesmo que estas sejam hiperproveitosas. Além disso, o problema não é de falta de lei, tampouco uma lei resolve: é de estrutura e educação, faltando ambas em nosso país acostumado à desordem e antiprogresso.
No dia a dia do novo código, o juiz vai informar que não pôde julgar na ordem cronológica os processos, por falta de servidores para trabalhar na Vara. Ele vai pôr os processos para julgar na ordem que ele quiser. Possivelmente, na ordem da quantidade de vezes que o advogado da parte vai mendigar uma decisão. A não ser que ele preferencialmente seja superlegal, coloque na ordem cronológica os julgamentos e só abra exceção por decisão fundamentada. Então o advogado para de ser responsável pelo atraso dos processos no Judiciário e não precisará mais aguentar reclamação de cliente, e todos estarão preferencialmente mais tranquilos.
    Trabalhar com processo e resolver os problemas só poderá ser tão gostoso como deliciar-se com uma pera quando não for baseado na esperança de bondade alheia, porque, como diz “a maçã” de Raul, “se esse amor ficar entre nós dois, vai ser tão pobre amor, vai se gastar...”. É que uma regra somente “preferencial” só poderá ser cumprida quando os presidentes do Tribunais preferencialmente atenciosos com os servidores entenderem que precisam gastar o orçamento público com menos gratificações e mais contratações de pessoas comprometidas. E, preferencialmente, as pessoas denunciem os maus servidores e as corregedorias preferencialmente os afastem.
    Abençoo o legislador que destacou a responsabilidade dos que agem com má-fé processual, aqueles que veem vantagem em mentir e produzir provas para protelar a resolução de um litígio. Se antes havia dúvidas, agora não mais: estes têm o dever de pagar multa e indenizar a outra parte pelos prejuízos sofridos se arguem mentiras. Aos advogados, que detêm o poder de produzir as provas e agir em nome de um cliente, convêm explicar às partes nervosas que se acalmem e procurem uma conciliação. A qualquer tempo. É dizer para o cliente que “amor só dura em liberdade, o ciúme é só vaidade. Sofro, mas eu vou te libertar” e tentar ser pragmático. Sem mais blá-blá-blá com hífen separatório.