sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

A CINDERELA E O PREFEITO NO CARNAVAL DE SALVADOR

Cinderela nasceu no bairro da Mata Escura e cresceu dançando ao som de pássaros, motos e tiros, musicados ou não. Sua infância lúdica se transformou quando, estuprada por seu padrasto, aos 13 anos já tinha responsabilidade de dar de comer a sua cria. Passou a juventude a acordar de madrugada e pegar dois ônibus lotados para ir ao trabalho, a encerar o chão e limpar os banheiros em faxinas de várias rainhas más nos bairros nobres da cidade.
Após ofertar suas flores a Iemanjá e suplicar que a salve dessa vida, Cinderela escuta sua patroa comentar que o Príncipe, ops, Prefeito, estaria a dar uma grande festa na cidade para escolher sua noiva, porém só as autoridades estavam convidadas ao camarote da praça. Eis que aparece uma Promotora, uma Juíza e uma Defensora, ops, as três fadas madrinhas, e, ao perceberem Cinderela em lágrimas, resolvem lhe fazer essa caridade: com um “abadá” sobrando, além de doá-lo à Cinderela, emprestam-lhe maquiagem, salto agulha, short da marca com nome de combustível, pagam o salão para mechas e escova progressiva no cabelo, transformando Cinderela na mais encantadora diva da festa.
Deslumbrada com o "all inclusive", Cinderela se esbalda. Dança com seu rebolado latino regada a misturas de uísque, energéticos, champanhes. É quando subitamente o Príncipe a convida para dançar arrocha e se encanta pela que parecia ser a próxima primeira dama da nação soteropolitana. Todavia, o LSD tomado inadvertidamente dispara a síndrome do pânico e, vendo alucinações de ratos e abóboras, Cinderela sai correndo, deixando a sandália gladiadora da patroa para trás. Era meia noite.